'
A monitorização hemodinâmica constitui uma ferramenta essencial no manejo de pacientes em terapia intensiva, especialmente naqueles que apresentam instabilidade hemodinâmica.
O presente conteúdo aborda a definição dos principais parâmetros hemodinâmicos, suas possíveis alterações e os métodos disponíveis para sua monitorização.
Corresponde à força exercida pelo sangue sobre as paredes dos vasos sanguíneos, sendo um dos principais determinantes da perfusão tecidual.
Fórmula:
Produto do débito cardíaco pela resistência vascular sistêmica (PA = DC x RVS).
Valores normais:
PA sistólica = 120-90 mmHg; PA diastólica = 80-60 mmHg.
Corresponde à pressão exercida pelo sangue na parede da veia cava superior, sendo equivalente à pressão no átrio direito.
Seus valores dependem da interação entre a função ventricular direita e o retorno venoso (geralmente relacionado ao estado volêmico);
A mensuração precisa exige adequado nivelamento do transdutor, geralmente na linha médio-axilar ao nível do quarto espaço intercostal.
Importância clínica:
Isoladamente, a análise da PVC pode gerar grande confusão, recomendando-se, portanto, sua análise em conjunto com o débito cardíaco.
Indicada na instabilidade hemodinâmica de origem cardiológica e/ou hipovolêmica.
Aplicações práticas:
Diante das evidências atuais, a PVC pode nos fornecer informações sobre a função do ventrículo direito e perfusão orgânica.
Atenção! A PVC não deve ser usada para fins de interpretação de fluidorresponsividade.
Métodos de monitorização:
Cateter venoso central.
Como utilizar a PVC na prática clínica?
A pressão arterial pulmonar sistólica reflete a pressão gerada pelo ventrículo direito durante a sístole na vasculatura pulmonar.
A pressão arterial pulmonar diastólica reflete a pressão diastólica do ventrículo direito na vasculatura pulmonar.
Métodos de monitorização:
C
ateter de artéria pulmonar (Swan Ganz), ecocardiograma que avalia a pressão sistólica da artéria pulmonar..
Força exercida pelo sangue no balonete insuflado em um ramo da artéria pulmonar, sendo reflexo indireto da pressão no átrio esquerdo (elimina as pressões do lado direito do coração).
Importância clínica:
Reflexo indireto da pressão atrial esquerda, pressão diastólica final do ventrículo esquerdo e volume diastólico final, refletindo a função ventricular sistólica e diastólica, bem como complacência e volemia.
Métodos de monitorização:
Cateter de artéria pulmonar (Swan Ganz).
Volume de sangue bombeado pelo coração em determinado período de tempo (medida de fluxo), sendo um reflexo da frequência cardíaca e do volume sistólico (reflexo da força de contração e do volume diastólico final).
Fórmula:
Produto do volume sistólico pela frequência cardíaca (DC = VS x FC)/ou razão da pressão arterial pela resistência vascular sistêmica (DC = PA/RVS).
Alterações:
Podem representar hipovolemia ou disfunção sistólica (quando DC diminuído) ou ainda representar aumento da demanda tecidual em condições de alto débito (quando DC aumentado).
Métodos de monitorização:
Cateter de artéria pulmonar (através de termodiluição); cateter arterial (através da análise do contorno da onda de pulso).
Para qual perfil de pacientes utilizar a variação da pressão de pulso?
Podem ser obtidos a partir de cálculos que envolvem basicamente o conhecimento da saturação venosa mista (SvO
2
) obtida por cateter venoso central.
Qual a diferença entre a ScVO2 e a SvO2?
Devido ao surgimento de novas estratégias minimamente invasivas de monitorização hemodinâmica e da falta de benefício clínico em estudos de sobrevida, seu uso está sendo cada vez mais desencorajado.
Análise do contorno da onda de pulso:
Técnica minimamente invasiva de estimativa do débito cardíaco baseada apenas na análise da onda de pulso arterial, sendo necessária apenas a instalação de um cateter arterial.
Ecocardiograma
:
Método não invasivo muito útil na avaliação do paciente em terapia intensiva.
Pode, ainda, estimar volume e responsividade a volume a partir das alterações respiratórias dinâmicas do diâmetro da veia cava inferior (pelo ecocardiograma transtorácico) ou da veia cava superior (pelo ecocardiograma transesofágico).
A relação E/E’ do fluxo valvar mitral e Doppler tecidual pode estimar com boa fidedignidade a pressão de oclusão de artéria pulmonar (POAP).
Limita-se apenas pelo fato de não ser um método de avaliação contínua.
Doppler esofágico:
Técnica que mede o fluxo arterial aórtico para estimativa do débito cardíaco, a partir de um transdutor esofágico.
Monitorização hemodinâmica funcional:
Os parâmetros hemodinâmicos acima descritos (PVC, POAP, PA, DC, SvO
2
) são clinicamente importantes para indicar a necessidade de reposição volêmica, bem como para indicação de terapia inotrópica e vasoativa.
No entanto, são parâmetros incapazes de determinar se o paciente em questão é responsivo a volume.
Ou seja, caso administrado volume, se este é capaz de responder com aumento do débito cardíaco.
A incapacidade de variáveis estáticas (como PVC, POAP) de predizer a resposta do débito cardíaco à administração de volume deve-se ao fato de que não existe uma única curva que indique a relação entre a pré-carga e o débito cardíaco, e sim várias curvas para cada nível de função ventricular.
Ou seja, para determinado valor de pré-carga, pode haver diferentes volumes sistólicos na dependência da função ventricular.
A maneira mais fidedigna de predizer a resposta de volume é mimetizar através de manobras o aumento do retorno venoso (como na manobra de elevação das pernas ou na fase expiratória da ventilação mecânica) e analisar variáveis dinâmicas como a variação da pressão de pulso (ΔPP) e a variação do volume sistólico (VVS) por meio da análise do contorno da onda de pulso.
Elevação passiva das pernas:
Durante a elevação passiva das pernas, ocorre um aumento do retorno venoso proveniente dos membros inferiores e abdome, determinando aumento na pré-carga, havendo aumento no débito cardíaco nos pacientes responsivos (vale destacar que a resposta é transitória, com efeito máximo cerca de 1 minuto após seu início).
Logicamente, torna-se necessária a presença de alguma ferramenta de monitorização (seja pela análise da onda de pulso ou por ecocardiografia) para estimar a resposta a volume, sendo considerado responsivo o paciente com aumento de > 10% no débito cardíaco.
Provas de volume:
A prova de volume é uma alternativa para avaliar a responsividade a volume em condições de indisponibilidade da análise da curva de onda de pulso.
O fundamento é simples, administrando-se um volume predeterminado de cristaloide ou coloide em curto espaço de tempo.
Espera-se alterações dinâmicas nos parâmetros hemodinâmicos (SvO
2
, pressão arterial, diurese), sendo que aumentos do débito cardíaco estimado indiretamente por estes parâmetros nos autorizam a instituir novas provas volumétricas.
O uso da PVC como parâmetro não é confiável, no entanto, caso haja um grande aumento na PVC não acompanhado de melhora dos parâmetros hemodinâmicos, estamos diante de um paciente não responsivo a volume e com risco de congestão.
Monitorização da perfusão tissular:
A monitorização hemodinâmica do paciente em terapia intensiva envolve não apenas os parâmetros macro-hemodinâmicos, apresentados previamente, como também a monitorização dos parâmetros de perfusão tissular (reflexo da micro-hemodinâmica), intimamente relacionados ao transporte capilar e consumo de oxigênio.
A principal causa de morte dentro da UTI é a síndrome da disfunção múltipla dos órgãos, entidade clínica associada ao choque circulatório, que exige da equipe de terapia intensiva monitorização constante desses parâmetros de perfusão tissular para a correta abordagem e proposta terapêutica.
Dentro desse conceito de monitorização da perfusão tissular e resposta terapêutica, a partir da reanimação hemodinâmica, discutiremos a seguir os parâmetros a serem monitorados, de maneira a introduzir o tema de reanimação guiada por esses parâmetros, pormenorizado no tópico de reanimação hemodinâmica volêmica e/ou por uso de drogas vasoativas.
Observação!
Não há superioridade ou inferioridade ao estabelecermos uma reanimação precoce guiada pelo lactato ou pela SvcO
2.
Revisão:
Yuri de Albuquerque (Medicina Intensiva).
Pinsky MR, Cecconi M, Chew MS, et al. Effective hemodynamic monitoring. Crit Care. 2022; 26(1):294.
Isseh IN, Lee R, Khedraki R, Hoffman K. A Critical Review of Hemodynamically Guided Therapy for Cardiogenic Shock: Old Habits Die Hard. Curr Treat Options Cardiovasc Med. 2021;23(5):29.
Saugel B, Kouz K, Meidert AS, Schulte-Uentrop L, Romagnoli S. How to measure blood pressure using an arterial catheter: a systematic 5-step approach. Crit Care. 2020 Apr 24;24(1):172.
De Backer D, Vincent JL. Should we measure the central venous pressure to guide fluid management? Ten answers to 10 questions. Crit Care. 2018; 22(1):43.
Monnet X, Teboul JL. Transpulmonary thermodilution: advantages and limits. Crit Care. 2017 Jun 19;21(1):147.
Vincent JL, Rhodes A, Perel A, Martin GS, Della Rocca G, Vallet B, Pinsky MR, Hofer CK, Teboul JL, de Boode WP, Scolletta S, Vieillard-Baron A, De Backer D, Walley KR, Maggiorini M, Singer M. Clinical review: Update on hemodynamic monitoring--a consensus of 16. Crit Care. 2011 Aug 18;15(4):229.
Swan HJ, Ganz W, Forrester J, et al. Catheterization of the heart in man with use of a flow-directed balloon-tipped catheter. N Engl J Med. 1970; 283(9):447-451.