Definição: Entre os métodos contraceptivos hormonais, destacam-se: contraceptivo oral (pílula), sistema intrauterino liberador de Levonorgestrel (SIU-LNG), contraceptivo injetável, implante de progestagênio, contraceptivo transdérmico (adesivo) e anéis vaginais.
A assistência em contracepção deve ser imparcial e abranger todas as técnicas disponíveis com suas respectivas taxas de efetividade, critérios de elegibilidade, indicações, contraindicações e possíveis efeitos colaterais para que a mulher ou o casal tenham as informações necessárias para escolher o método mais adequado à sua realidade.
O indicador mais utilizado para avaliar a efetividade é o índice de Pearl (IP), que mede o número de gestações a cada 100 mulheres no primeiro ano de uso do método. A taxa de gravidez sem uso de alguma estratégia contraceptiva é de 85 gestações a cada 100 mulheres em 1 ano.
Em 2015, a Organização Mundial da Saúde (OMS) publicou a atualização das orientações definindo novos critérios de elegibilidade para o emprego de métodos anticoncepcionais, aprimorando as recomendações que dizem respeito aos fatores de saúde das mulheres e à possibilidade de uso de métodos contraceptivos femininos reversíveis altamente efetivos.
O Centers for Disease Control and Prevention
(CDC) publicou, em agosto de 2024, uma diretriz alterando pontos importantes na elegibilidade dos métodos contraceptivos seguindo as categorias 1, 2, 3 e 4 já estabelecidas pela OMS. Os principais pontos de mudança foram em relação às pacientes com trombofilias, portadoras de adenomas hepáticos, pacientes com lúpus e portadoras de anemia falciforme.
O sistema intrauterino com Levonorgestrel é comercializado como Mirena ® e Kyleena ® , e ambos consistem em um dispositivo em formato de "T" com estrutura de polietileno, sendo que o Kyleena ® é menor e mais fino.
A haste vertical é revestida por um cilindro composto de polidimetilsiloxano com Levonorgestrel, que é liberado em dose relativamente constante de 20 microgramas/dia no Mirena
®
através de uma membrana semipermeável. Por sua vez, o Kyleena
®
apresenta mesma estrutura e hormônio, porém a liberação inicial é de 17,5 microgramas/dia, posteriormente reduzindo para 9 microgramas/dia. As duas apresentações têm validade de 5 anos. O Mirena
®
está sendo validado para uso por até 8 anos atualmente, segundo a OMS e a Food and Drug Administration (FDA).
Mecanismo de ação: O mecanismo de ação do SIU-LNG consiste na combinação de atrofia endometrial, estímulo da formação de muco cervical espesso e redução da motilidade tubária, desfavoráveis à progressão dos espermatozoides no trato genital superior.
Momento ideal: Para a colocação do SIU-LNG, o momento ideal é durante o período menstrual, uma vez que é possível excluir a possibilidade de gravidez e o colo uterino encontra-se mais amolecido e dilatado, facilitando a inserção, com redução da chance de expulsão. Para mulheres que comprovadamente não estejam grávidas e desejam iniciar o método, o SIU-LNG pode ser colocado em qualquer momento do ciclo menstrual.
Complicações: Os principais riscos associados ao uso de SIU-LNG correlacionam-se (em sua maioria) com a inserção incluem:
Caso a paciente apresente infecção nos primeiros 60 dias após a colocação, deve-se iniciar antibioticoterapia de amplo espectro direcionada à microbiota vaginal normal. A remoção do SIU-LNG não é obrigatória, devendo isso ser conversado e decidido em conjunto com a paciente.
Mudança de um contraceptivo diferente para o DIU de Levonorgestrel:
O dispositivo pode ser inserido imediatamente se for determinado que a mulher não está grávida. A menos que a mulher se abstenha de relações sexuais, um método contraceptivo de apoio é necessário se já se passaram > 7 dias desde o início do sangramento menstrual. Quando um método contraceptivo adicional for necessário, considere continuar o método anterior da mulher por 7 dias após a inserção.
Os estrogênios disponíveis atualmente em formulações anticoncepcionais orais (ACOs) podem ser de dois tipos: natural (Valerato de estradiol e 17-beta-estradiol) ou sintético (Etinilestradiol [EE]).
É possível encontrar o EE associado a diversos progestagênios que apresentam variação na atividade androgênica sobre pele, pelos e perfil lipídico , como:
Todos os progestagênios utilizados reduzem sinais e sintomas androgênicos mediante a redução do nível sérico de testosterona livre, porém alguns o fazem mais que outros. Seu uso limita a ação da 5-alfa-redutase, responsável pela conversão da testosterona em sua forma ativa em di-hidrotestosterona.
Os ACOs são considerados de baixa dosagem quando apresentam conteúdo diário de EE < 50 microgramas. As doses variam de 15-35 microgramas de EE.
A dose dos hormônios pode ser idêntica em todas as pílulas da cartela, caracterizando-a como monofásica. Contraceptivos bifásicos ou trifásicos são aqueles em que há variações da dose de estrogênio e progestagênio ao longo do ciclo, visando a diminuir os efeitos adversos e as alterações metabólicas induzidas pelos hormônios.
Quando comparadas com as monofásicas, a s formulações multifásicas têm maior chance de equívoco no uso, em razão das diversas cores das pílulas na cartela, e maior incidência de spotting, em virtude do colapso endometrial.
Mecanismo de ação: Ocorre por meio de intervenção no eixo neuroendócrino, interferindo no mecanismo de estimulação ovariana pelas gonadotrofinas por ação direta sobre os mecanismos de feedback que cursam com bloqueio gonadotrófico, especialmente do pico de LH, com isso impedindo que ocorra a ovulação. Em razão dessa característica, são denominados anovulatórios.
Os ACOs também atuam por meio do componente progestagênico. Intervêm no aspecto do muco cervical, que passa a ser impenetrável pelo espermatozoide, e no endométrio, tornando-o hipotrófico, condição considerada inóspita para a implantação do embrião.
Em caso de esquecimento: A paciente deve tomar a pílula que esqueceu imediatamente ao lembrar-se; e a do próximo dia, no horário habitual. Caso lembre-se apenas no momento da pílula seguinte, ambas devem ser tomadas ao mesmo tempo. Quando o ACO for de baixa dosagem hormonal, ou se mais de uma pílula for esquecida no ciclo, o uso deve continuar normalmente até o fim da cartela, porém a paciente precisa utilizar concomitantemente um método de barreira por 1 semana.
Caso não haja sangramento ao fim do ciclo: A pílula deve ser mantida, porém a paciente precisa procurar atendimento médico para excluir a possibilidade de gravidez, uma vez que todo método apresenta um índice de falha.
Eficácia: Sendo usada corretamente, apresenta taxa de falha em torno de 0,5/100 mulheres/ano, independentemente da formulação.
Existem dois tipos de contraceptivos orais contendo apenas progestagênio: minipílulas (Noretisterona ou Levonorgestrel) e a pílula de Desogestrel.
Mecanismo de ação: Promove alteração no endométrio e do muco cervical, dificultando a fecundação e a implantação do embrião no endométrio.
Modo de uso: A usuária deve tomar 1 comprimido/dia de forma ininterrupta. O início do uso pode ser a qualquer momento, em qualquer dia do ciclo ou do puerpério, entretanto não deve ser administrado nos primeiros 30 dias de puerpério, uma vez que o risco de gravidez nesse período é praticamente inexistente e porque pode provocar aumento do sangramento próprio dessa fase (lóquios).
Minipílula: As minipílulas são formulações mais antigas que podem ser de Noretisterona ou Levonorgestrel. Esses medicamentos inibem a ovulação em aproximadamente 50%; com isso, as mudanças promovidas no muco têm duração máxima de 2 horas. Dessa maneira, o comprimido deve ser tomado diariamente no mesmo horário, e um atraso > 3 horas na ingestão requer que outro método anticoncepcional seja utilizado pelas 48 horas subsequentes.
Desogestrel: Mais recentemente, outra composição apenas de progesterona foi desenvolvida, com 75 microgramas de Desogestrel, apresentando eficácia semelhante à dos ACOs, com inibição da ovulação em 99% dos casos, permitindo a ingesta atrasada do comprimido em até 12 horas sem comprometimento do efeito.
As pílulas contendo apenas progestagênios têm poucos efeitos cardiovasculares e na cascata de coagulação. Mostram-se, portanto, apropriadas para pacientes com risco aumentado para doenças cardiovasculares e portadoras de trombofilias. Podem ser utilizadas por pacientes com enxaqueca, tabagistas > 35 anos de idade e lactantes > 6 semanas pós-parto, uma vez que não interferem na produção do leite.
Desvantagens: Incidência de spotting , amenorreia e, em menor proporção, períodos prolongados de menorragia.
Contraindicação:
Os contraceptivos de uso injetável intramuscular estão disponíveis em duas apresentações no Brasil: uma contendo estrogênio natural e progestagênio e outra apenas com progestagênio.
As principais razões para a descontinuidade do método são sangramento irregular e ganho ponderal, este último especialmente em mulheres já obesas.
O implante de progestagênio disponível em escala global é comercializado como Implanon ® e consiste em um bastão subdérmico único revestido por um polímero de Acetato de etilenovinil contendo 68 mg de Etonogestrel. Tem alta efetividade em comparação com os métodos cirúrgicos, com falha teórica e real de 0,05%.
Mecanismo de ação: O hormônio é liberado de maneira contínua e age por meio de bloqueio da ovulação, aumento da viscosidade do muco cervical e atrofia endometrial, impedindo, também, a fecundação.
Modo de uso: O local de escolha para a implantação do bastão é na face interna do braço, ao longo do sulco do bíceps, a uma distância de 6-8 cm da prega antecubital. A inserção é rapidamente realizada com dispositivo específico após aplicação de anestesia local. Depois da inserção, deve ser confirmada a presença palpável do implante pelo médico e pela paciente.
O efeito contraceptivo se inicia 8 horas após a inserção e dura até 3 anos. A retirada do implante pode ser realizada ambulatorialmente, em virtude da sua localização superficial, sendo feita uma pequena incisão para a retirada do bastão.
Contraindicação: Mulheres com neoplasia ou doença hepática em atividade, câncer de mama atual ou prévio, gestantes e pacientes com sangramento uterino a esclarecer.
As pacientes que optarem pelo método devem ser orientadas sobre a possibilidade de sangramento irregular persistente, que não afeta a eficácia contraceptiva, porém pode ser bastante incômodo, levando ao desejo da descontinuidade do método.
O sistema transdérmico (Evra ® ), um adesivo de coloração rosada com 20 cm 2 de área, consiste em uma camada interna formada por matriz com liberação diária de 203 microgramas de Norelgestromina e 33,9 microgramas de EE e uma camada externa impermeável.
Modo de uso: A aplicação deve ser realizada no abdome inferior, região superior do dorso, nádegas ou região inferior do segmento proximal do antebraço – não deve ser aplicado nas mamas. O primeiro adesivo é colocado, por convenção, no primeiro dia do ciclo, sendo trocado 1x/semana. Ao fim da terceira semana, é feita uma pausa de 7 dias para que ocorra a menstruação e, então, é iniciado novo ciclo.
Observação: O método tem maior taxa de falha em pacientes com ≥ 90 kg.
O anel vaginal (NuvaRing ® ) é um contraceptivo hormonal não oral com liberação contínua diária de 15 microgramas de EE e 120 microgramas de Etonogestrel. Consiste em um anel flexível de polímero com diâmetro interno de 50 mm e externo de 54 mm que deve ser inserido na vagina em decorrência da absorção vaginal. Uma vantagem do método é a ausência do efeito de primeira passagem pelo fígado, apresentando menos impacto metabólico.
A incidência de casos de colapso endometrial é baixa, bem como a queixa por parte dos homens durante a relação sexual. Em caso de incômodo durante o ato sexual, o anel pode ser retirado temporariamente e reintroduzido em um prazo de 3 horas sem prejuízo da eficácia.
O método apresenta baixa incidência de sangramento de escape, com bom controle do ciclo menstrual. Apesar de haver relatos de aumento na lubrificação vaginal, não há evidência de elevação de infecções vaginais e leucorreia.
Mecanismo de ação: O mesmo do contraceptivo oral combinado.
Modo de uso: Deve ser inserido pela mulher, inicialmente, no primeiro dia do ciclo e removido depois de 3 semanas. O novo anel deve ser inserido após pausa de 1 semana para que haja sangramento menstrual.
Não raramente ocorrem pequenos acidentes no uso de métodos contraceptivos de barreira ou comportamentais que expõem a mulher ao risco de uma gestação não desejada. Para essas circunstâncias, foi idealizada a contracepção de emergência, que consiste na utilização de medicamentos ou dispositivos depois de uma relação desprotegida. As formas mais difundidas para a realização de anticoncepção de emergência são o método de Yuzpe e progestágenos.
O método de Yuzpe consiste na ingestão de comprimidos de anticoncepcionais hormonais orais combinados com EE e progestagênio.
A dose de EE ideal é de 200 microgramas, sendo dividida em duas doses com intervalo de 12 horas. Por exemplo, se a pílula contém 50 microgramas, devem-se utilizar dois comprimidos de 12/12 horas.
A eficácia do método de Yuzpe, segundo um estudo multicêntrico desenvolvido pela OMS, varia de acordo com o intervalo entre a relação sexual desprotegida e o uso da medicação. Se utilizado até 24 horas, é de 98%; de 25-48 horas, é de 95,9%; e entre 49-72 horas, é de 95,3%.
O Levonorgestrel isolado (dose única de 1,5 mg) é a forma mais utilizada para contracepção de emergência devido à maior efetividade e à ausência de efeitos colaterais do estrógeno na interação com medicamentos antirretrovirais.
O mecanismo de ação varia. Se utilizado na primeira fase do ciclo menstrual, impede a ovulação; na segunda fase, atua principalmente pelo espessamento do muco cervical. Atualmente, não há registros de que haja efeitos teratogênicos, que interfira na implantação ou que altere o endométrio.
A utilização do Levonorgestrel pode prevenir cerca de dois terços das gestações se for iniciada até 24 horas depois do ato sexual.
Autoria principal: Camilla Luna (Ginecologista e Obstetra pela UERJ e FEBRASGO, especialista em Reprodução Humana pela AMB).
Revisão: Caroline Oliveira (Ginecologia. Especialista de Patologia do Trato Genital Inferior e Colposcopia. Doutora em Ciências Médicas pela UFF).
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