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Cefaleias Primárias

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O conceito de cefaleia primária, uma das principais queixas nos consultórios médicos e salas de emergência, é ainda impreciso, no entanto vamos definir como doenças crônicas de apresentação episódica ou contínua, com etiologia desconhecida, mas de natureza disfuncional, não estrutural. Neste tópico, serão abordadas a cefaleia tensional e a migrânea (enxaqueca). [cms-watermark]

Para mais informações sobre Cefaleias Trigêmino-Autonômicas e Cefaleia Crônica Diária , acesse os conteúdos específicos. [cms-watermark]

    Cefaleia tensional:
  • A cefaleia do tipo tensional episódica é a mais frequente das cefaleias primárias, prevalente na 4ª década de vida. Sua crise é de fraca ou moderada intensidade, com sensação de aperto ou pressão e, na maioria das vezes, é bilateral. A gênese da dor ainda é desconhecida, entretanto mecanismos miofasciais periféricos e desregulação do processo central de controle da dor parecem estar envolvidos no seu desenvolvimento.
    Migrânea (enxaqueca):
  • A enxaqueca é uma desordem episódica cuja peça central é uma forte dor de cabeça, geralmente associada a náusea e/ou sensibilidade à luz e ao som. É uma das queixas mais comuns encontradas pelos neurologistas na prática do dia a dia;
  • É uma doença composta de quatro fases:
    • Sintomas premonitórios;
    • Aura;
    • Cefaleia;
    • Pródromos.
  • A teoria mais aceita para explicar a aura e a cefaleia defende que a depressão alastrante cortical (uma onda lenta e intensa de atividade cortical) se espalha por um amplo segmento do córtex cerebral. Como consequência, ocorrem ativação de aferentes no nervo trigêmeo e liberação de moléculas inflamatórias na região dos vasos piais. A ativação da via trigeminal envolve conexões com hipotálamo, núcleos do tronco encefálico e sistemas nervosos autônomo e límbico responsáveis por respostas emocionais, vegetativas e outros sintomas associados à síndrome.

Anamnese

É fundamental caracterizar a dor por: [cms-watermark]

  • Tipo;
  • Localização;
  • Início;
  • Intensidade;
  • Tempo de ascensão;
  • Duração;
  • Frequência das crises;
  • Irradiação;
  • Fatores desencadeantes, de exacerbação e de alívio;
  • Presença de sintomas associados: [cms-watermark]
    • Náuseas;
    • Vômitos;
    • Principalmente febre;
    • Rebaixamento do nível de consciência;
    • Perda de força muscular;
    • Disartria. [cms-watermark]

É essencial entender a presença de outros fatores, como:

  • Sintomas premonitórios;
  • Aura;
  • Trauma recente;
  • Uso de medicamentos;
  • Comorbidade;
  • Fatores ambientais relacionados;
  • Relação com período menstrual e/ou gestação;
  • Antecedentes pessoais e familiares;
  • Impacto na qualidade de vida. [cms-watermark]

Cefaleia Tensional (CT)

Quadro clínico: Basicamente, existem três tipos de CT:

  • A episódica infrequente, em que os ataques ocorrem menos de um dia por mês;
  • A episódica frequente, em que as crises se manifestam 1-14 dias por mês;
  • A CT crônica, com dores de cabeça ocorrendo mais de 14 dias por mês. [cms-watermark]
    Principais características clínicas:
  • A maioria das crises se inicia no período da manhã, e a progressão ao longo do dia é comum;
  • Início noturno deve fomentar investigação adicional;
  • Os gatilhos mais comuns para a dor são:
    • Estresse físico ou mental;
    • Desidratação;
    • Alteração dos padrões normais de sono;
    • Abstinência de cafeína;
    • Flutuações hormonais. [cms-watermark]
  • A CT pode coexistir com a migrânea com aura, com o paciente apresentando tipos distintos de crise.

Migrânea (Enxaqueca)

    Quadro clínico:
  • Sintomas premonitórios: Sintomas que ocorrem cerca de 24-48 horas das crises:
    • Bocejos;
    • Euforia;
    • Depressão;
    • Irritabilidade;
    • Constipação;
    • Fissuras alimentares;
    • Rigidez de nuca. [cms-watermark]
  • Aura: Cerca de 25% dos migranosos apresentam aura, que pode ocorrer antes ou durante a dor. Os sintomas podem ser:
    • Positivos [cms-watermark]
      • Visuais: escotomas cintilantes, objetos geográficos;
      • Auditivos: zumbido, músicas;
      • Somatossensitivos: queimação, parestesia. [cms-watermark]
    • Negativos:
      • Perda da visão;
      • Perda da audição;
      • Perda da força em determinada região do corpo. [cms-watermark]
  • Cefaleia: Normalmente unilateral, característica latejante, associada a foto, fono ou osmofobia. O quadro álgico é acompanhado, em geral, de náusea e vômitos;
  • Pósdromo: Após a resolução da dor, o paciente sente-se cansado, e movimentações súbitas podem provocar o retorno da dor. É normal a pessoa se sentir exausta nessa fase.

Enxaqueca: Uso de anticorpos monoclonais?

    Fatores desencadeantes:
  • Estresse emocional;
  • Chocolate;
  • Hormônios (estrogênio);
  • Menstruação;
  • Nitratos;
  • Vinho;
  • Aspartame;
  • Privação de sono.
    Complicações:
  • Status migranoso: Crise com duração de mais de 72 horas;
  • Aura persistente sem infarto é definida por sintomas de aura que persistem ≥ 1 semana, sem evidência de infarto em neuroimagem;
  • O infarto-enxaqueca é definido por uma crise de enxaqueca que ocorre em um paciente com enxaqueca com aura, na qual um ou mais sintomas de aura persistem por mais de 1 hora e a neuroimagem evidencia infarto em área cerebral relevante;
  • Convulsão desencadeada por aura de enxaqueca é aquela desencadeada por uma crise de enxaqueca com aura.

Exame Físico

No exame cefaliátrico, são importantes:

  • Inspeção estática e dinâmica da cabeça e da região cervical;
  • Palpação e percussão de: [cms-watermark]
    • Ossos frontal, maxilar e mandibular;
    • Articulação temporomandibular;
    • Músculos da cabeça e do pescoço;
    • Nervos periféricos;
    • Artérias carótida comum e temporal;
    • Globo ocular. [cms-watermark]
  • Ausculta das artérias carótidas com a campânula do estetoscópio. [cms-watermark]

A migrânea e a cefaleia tensional são diagnósticos clínicos, ou seja, história e exame físico são fundamentais. Não é necessário exame complementar.

Pode ser benéfico para o diagnóstico o registro de um diário da dor, em que o indivíduo insere a frequência das crises, bem como características da dor, intensidade, tempo de duração, fatores que aliviaram e fatores que desencadearam.

Texto alternativo para a imagem Fluxograma de abordagem inicial da cefaleia
    Para mais informações, acesse:
  • Cefaleia secundária;
  • Cefaleia crônica diária;
  • Abordagem Inicial da Cefaleia na APS.

Cefaleia Tensional Frequente

A. Pelo menos 10 episódios de cefaleia que ocorrem de 1-14 dias em média > 3 meses (≥ 12 dias e < 180 dias por ano) e preenchendo os critérios de B a D.

B. Cefaleia com duração de 30 minutos-7 dias.

    C. Apresenta pelo menos duas dessas quatro características:
  • Bilateral;
  • Em pressão ou aperto (não pulsátil);
  • Intensidade ligeira ou moderada;
  • Não é agravada por atividade física de rotina, como caminhar ou subir escada;
  • Ausência de náusea e vômitos;
  • Apenas foto ou fonofobia.

D. Não é mais bem explicada por outro diagnóstico da classificação internacional.

Migrânea (Enxaqueca)

A. Ao menos cinco ataques que preencham os critérios B, C e D.

B. Duração de 4-72 horas.

    C. Apresenta duas dessas quatro caraterísticas:
  • Localização unilateral;
  • Qualidade pulsátil;
  • Dor moderada a grave;
  • Piora com exercícios físicos.
    D. Durante o ataque, ao menos um dos seguintes sintomas:
  • Náusea e/ou vômitos;
  • Foto e fonofobia.

E. Não é mais bem explicada por outro diagnóstico.

Veja mais em: Como diagnosticar e tratar a enxaqueca em 10 etapas?

  • Cefaleia tensional;
  • Cefaleia trigêmino-autonômicas;
  • Cefaleias secundárias;
  • Migrânea;
  • Hipertensão arterial;
  • Disfunções da articulação temporomandibular.

Cefaleia Tensional

O tratamento deve seguir em regime ambulatorial e inclui modificações no estilo de vida (estresse físico: cansaço, exagero de atividade física, especialmente no calor e sob o sol; muscular: posicionamento do pescoço no sono ou no trabalho; ou emocional) em associação a medidas farmacológicas específicas.

    Terapia profilática: Está indicada para casos em que as crises ocorram > 2 vezes por semana, sendo o fármaco de escolha a Amitriptilina.
    Terapia abortiva: Consiste em analgésicos comuns ou anti-inflamatórios não esteroidais (AINE), sempre tendo em mente a responsabilidade do médico para não estimular o uso abusivo de analgésicos.

Migrânea (Enxaqueca)

    Modificações no estilo de vida/medidas comportamentais:
  • Realização de exercícios físicos no período da manhã;
  • Dormir a quantidade necessária para sensação de sono reparador – em local escuro e com temperatura baixa;
  • Evitar alimentos desencadeantes de dor:
    • Chocolate;
    • Bebidas fermentadas;
    • Glutamato monossódico;
    • Conservantes. [cms-watermark]
  • Evitar uso abusivo de analgésicos.
    Terapia profilática
  • Ataques recorrentes que interfiram na qualidade de vida;
  • Ataques frequentes (quatro ou mais ataques por mês; ou oito ou mais dias de dores de cabeça por mês);
  • Falha no tratamento abortivo;
  • Preferência do paciente;
  • Sintomas específicos, como migrânea hemiplégica e aura, com sintomas de tronco encefálico;
  • Vários fármacos podem ser utilizados no tratamento, e sua escolha correta deve ter como base o perfil de seus efeitos colaterais;
  • O Topiramato é um excelente medicamento que pode ser usado em baixas doses no tratamento, sendo seu efeito colateral mais grave a litíase renal – principalmente em pacientes com predisposição à formação de cálculos e glaucoma agudo de ângulo fechado.
    Terapia abortiva:
  • Tratamentos abortivos geralmente são mais eficazes se forem administrados precocemente no curso da enxaqueca;
  • Quando se opta por tratamento agudo, devem-se dividir as crises em leve/moderada ou moderada/grave;
  • Crise leve/moderada: Pode ser tratada com anti-inflamatórios (Ibuprofeno, Naproxano, Diclofenaco);
  • Crise moderada/grave: É possível utilizar os fármacos triptanos (Sumatriptano, Naratriptano).

Qual a novidade no tratamento da enxaqueca aguda?

Vários medicamentos antagonistas do peptídeo relacionado com o gene da calcitonina oral (CGRP) (ex.: Rimegepant e Ubrogepant) estão surgindo como opções de tratamento para ataques agudos de enxaqueca.

Autoria principal: Daniel Bueno Escobar Peixoto (Neurologia).

Revisão: Philipp Oliveira (Medicina de Família e Comunidade).

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