Definição: Grupo de doenças respiratórias que cursam com rouquidão, tosse ladrante, estridor predominantemente inspiratório e graus variados de desconforto respiratório. O comprometimento anatômico é bastante variável e pode envolver a laringe (laringite), a laringe e a traqueia (laringotraqueíte) ou a laringe, a traqueia e os bronquíolos (laringotraqueobronquite). A etiologia também é variável (vírus e bactérias), sendo os vírus os principais agentes causadores da doença.
Os sintomas são decorrentes da inflamação da laringe e da região subglótica. A causa é desconhecida, mas fatores alérgicos e psicológicos parecem estar envolvidos. Infecções virais podem desencadear o quadro, e os sintomas são predominantemente noturnos.
Os vírus infectam a mucosa nasal e faríngea, disseminando-se posteriormente até laringe e traqueia. A via aérea terá um grau variado de obstrução, de acordo com a congestão e o edema dessa região durante o quadro infeccioso. O edema da região subglótica da traqueia leva à restrição do fluxo de ar, gerando estridor inspiratório.
A etiologia viral é a mais comum. Dentre os principais vírus, temos parainfluenza (tipos 1, 2 e 3), influenza A e B e vírus sincicial respiratório. Outras causas virais são: SARS-CoV2, principalmente variante Ômicron, rinovírus, enterovírus e herpes-vírus simples. Podem ocorrer também por infecções bacterianas, sendo mais frequente a espécie Mycoplasma pneumoniae, acometendo crianças maiores que 5 anos de idade.
Difteria é uma causa extremamente rara. Embora, haja maior número de casos no outono e inverno, o crupe viral ocorre durante o ano todo.
Figura 1.
Caixa de voz
Figura 2.
Criança com crupe
Sinais e sintomas iniciais:
Os sintomas iniciais assemelham-se aos de um resfriado comum, com tosse leve, rinorreia clara, faringite e febre baixa. Dentro de 12-48 horas, os sintomas se intensificam e tornam-se característicos: tosse ladrante ou metálica, estridor, febre (geralmente mais elevada) e, nos casos mais graves, sinais de desconforto respiratório.
O quadro pode ser autolimitado em 3-7 dias, porém, nos casos mais graves, há evolução para taquicardia, taquipneia, retrações esternais, tiragem subcostal e intercostal, cianose, agitação psicomotora e outros.
Nos casos graves, pode haver insuficiência respiratória com fadiga da musculatura respiratória, hipercapnia e hipóxia, e pode ter duração de até 14 dias.
Laringite infecciosa aguda: É a inflamação da porção subglótica da laringe, geralmente ocasionada por uma infecção viral. Normalmente, acomete lactentes e pré-escolares (6 meses-3 anos de idade), com pico de incidência por volta de 18 meses de idade, predominantemente no gênero masculino.
Laringotraqueobronquite: É a infecção viral do epitélio respiratório da laringe, traqueia e árvore broncoalveolar. É a forma mais comum e típica da crupe, correspondendo a 90% de todos os casos. Nesses casos, há presença de sibilos e de tempo expiratório prolongado.
Laringite estridulosa ou crupe espasmódico: Ocorre com maior frequência em crianças de 3 meses a 3 anos de idade. A clínica é semelhante à da laringotraqueobronquite, mas não há história de pródromos virais e febre. Está relacionada a processo alérgico e não inflamatório.
No crupe espasmódico, a criança geralmente acorda durante a noite com tosse ladrante ("de cachorro"), metálica, inspiração ruidosa e angústia respiratória, parecendo ansiosa e assustada, geralmente afebril. A gravidade dos sintomas diminui em algumas horas, e a criança acorda bem no dia seguinte (mantendo apenas uma leve rouquidão e tosse).
Observação! O risco de obstrução de vias aéreas é característico de cada indivíduo e, normalmente, tem relação com história de atopia e hiper-reatividade de vias aéreas. Dessa forma, a expressão de gravidade da doença, bem como as chances de recorrência, é muito variável. As recorrências são mais comuns entre 3-6 anos de idade, diminuindo com o crescimento das vias aéreas. História familiar positiva é fator de risco para crupe esporádico ou recorrente.
Sinônimos: Crupe membranoso, crupe pseudomembranoso, laringotraqueobronquite membranosa.
Principal agente etiológico: S. aureus . Outros: estreptococos (pneumococo, grupo A e não grupo A beta-hemolítico, alfa-hemolítico), Moraxella catarrhalis e Haemophilus sp .
Atenção!
Todos os pacientes com suspeita de traqueíte bacteriana devem ser internados, pois geralmente têm sinais de toxemia, desidratação ou incapacidade de ingerir líquidos, estridor importante ou sinais de esforço respiratório em repouso e ausência de resposta à Epinefrina ou piora clínica após 2 horas de sua administração.
Apresentação clínica:
Sinais de crupe viral e de epiglotite associados à febre alta (> 38,5°C) e toxemia. Sintomas mais prolongados do que na epiglotite. O quadro pode apresentar evolução rápida, progredindo para obstrução total de via aérea em pouco tempo de doença.
Dica para diferenciar traqueíte bacteriana da viral:
Quando não há resposta ao tratamento inicial com corticoides e Adrenalina inalatória.
Pode-se identificar, pela laringoscopia, exsudato purulento malcheiroso não aderido, bloqueando a luz da traqueia. A cultura do material purulento revela a bactéria causadora do quadro. As hemoculturas são, em geral, negativas.
Complicações da laringotraqueíte ou laringotraqueobronquite infecciosas:
Ocorrem em cerca de 15% dos pacientes: extensão do processo infeccioso para ouvido médio, bronquíolos terminais ou parênquima pulmonar. Se houver associação de
S. aureus
, é possível haver síndrome do choque tóxico.
O diagnóstico é clínico, havendo pouca necessidade de exames complementares. Radiografia e hemograma não são rotineiramente indicados, mas um leucograma com contagem elevada de neutrófilos jovens poderá sugerir infecção bacteriana.
Radiografia cervical: Pode demonstrar típico estreitamento subglótico do crupe em incidência posteroanterior (sinal da ponta de lápis ou torre de igreja). Desvantagens: Esse sinal pode estar presente em pacientes saudáveis e, se presente na vigência do quadro agudo, não se correlaciona com gravidade da doença. A radiografia é útil quando há suspeita de aspiração de corpo estranho, ou seja, para diagnóstico diferencial.
Figura 3.
Sinal da torre de igreja.
Créditos:
Frank Gaillard/Wikimedia commons
| Escore de Gravidade do Crupe (SBP) | ||
|---|---|---|
| Sinal | 0 | 1 |
| Estridor | Ausente | Com agitação |
| Retração | Ausente | Leve |
| Entrada de ar | Normal | Normal |
| Cor | Normal | Normal |
| Nível de consciência | Normal | Agitação sob estímulo |
| Escore de Gravidade do Crupe (SBP) | ||
|---|---|---|
| Sinal | 2 | 3 |
| Estridor | Leve em repouso | Grave em repouso |
| Retração | Moderada | Grave |
| Entrada de ar | Diminuída | Muito diminuída |
| Cor | Cianótica com agitação | Cianótica em repouso |
| Nível de consciência | Agitação | Letárgico |
As infecções de vias aéreas superiores são as doenças mais frequentes da infância, e são o principal motivo de ida ao pronto-socorro. É muito importante o médico saber diagnosticar e diferenciar os casos que necessitam apenas de tratamento sintomático daqueles casos em que há infecção bacteriana, necessitando antibioticoterapia.
A principal medida na urgência do tratamento é garantir que as vias aéreas estejam pérvias. Manter a criança calma, evitar manipulação e exames desnecessários.
Nas manifestações clínicas leves, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) recomenda usar umidificação do ar inspirado, antitérmicos e hidratação oral. No entanto, muitos autores desaconselham o uso da nebulização, exceto nos casos com necessidade de oxigênio suplementar.
O uso de Dexametasona oral ou parenteral (0,15-0,6 mg/kg, máximo de 16 mg), dose única, melhora o sono do paciente, encurta a doença e reduz a ansiedade dos pais. A nebulização com Budesonida inalatória (2 mg) parece apresentar efeito clínico semelhante à Dexametasona IM. Alternativas à Dexametasona (para casa): Prednisolona (2 mg/kg/dia – máximo de 60 mg/dia – VO, por 3 dias) ou Budesonida inalatória (2 mg/dose de 12/12 horas, por 5 dias).
O tipo de corticoide faz diferença no tratamento da crupe? Veja o vídeo a seguir:
Nos casos de crupe moderado ou grave, usar nebulização com Adrenalina (1:1.000): dose inalatória de 0,5 mL/kg de Adrenalina (máximo: 5 mL via inalatória). O benefício é observado em 30-60 minutos, e o efeito desaparece em 2 horas; a criança deve ficar em observação no hospital por 3-4 horas. Pacientes que necessitam de mais que 1-2 doses de Adrenalina para melhora dos sintomas devem ser hospitalizados (principalmente se houver persistência ou evolução dos sinais de esforço respiratório).
A nebulização com Adrenalina está indicada para os pacientes que apresentarem estridor de moderado a acentuado em repouso, quando houver necessidade de intubação, desconforto respiratório ou hipóxia. Usar com cuidado nos pacientes taquicárdicos ou cardiopatas.
Antitussígenos e descongestionantes não têm eficácia comprovada e não são recomendados.
Tratamento:
UTI + intubação orotraqueal (de preferência em centro cirúrgico com endoscopia e com tubo menor que o habitual para o tamanho da criança) + antibioticoterapia endovenosa.
A intubação geralmente é necessária por 3-7 dias. Os cuidados com as cânulas devem ser meticulosos, dada a chance de obstrução pelas membranas.
Antibioticoterapia:
Cefalosporina de 2ª geração (Cefuroxima) ou de 3ª geração (Ceftriaxona) como drogas únicas.
Não há resposta terapêutica ao uso de corticoides ou de Adrenalina.
Autoria principal: Ana Carolina Pomodoro (Pediatria pela UFF e SBP).
Revisão:
Gabriela Guimarães Moreira Balbi (Pediatria pela UFPR e Reumatologia Infantil pela UNIFESP).
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